O
que aconteceu? Será um sequestro? Prenderam um traficante perigoso?
Acertaram alguém no tiroteio? Um foragido da Justiça foi
encontrado? Alguém morreu? Quantas vítimas? Os moradores do centro
de Porto Alegre apavoraram-se com o que viram passar à sua frente.
O nervoso Grupamento de Operações Especiais andava na
contramão com seus homens fortemente armados, sob uma chuva que
começava a cair. Foram encontrar-se com o Batalhão de Choque e mais
210 policiais militares, além de seus cães adestrados e carros de
combate. O clima tenso parecia preparar-se para um derramamento de
sangue.
Os uniformes novos do Batalhão de Choque e seus escudos
reluzentes poderiam impressionar até o mais insensível dos
assassinos, assim como suas botas enormes prontas para esmagar o
inimigo. Sorte dos bandidos que toda essa força e esse aparato
policial não é colocado contra eles. Senão eles veriam que o mundo
do crime não compensa.
Todos esses homens e essas armas foram colocados em
frente ao palácio do governo para protegê-lo desse grupo perigoso
dos professores, quer dizer, professoras (a maioria são mulheres).
Sim, nunca se sabe o que professoras em greve estão tramando. Essas
senhoras com cara de anjo podem estar carregando bombas. Vejam essas
sinetas estridentes, o que garante que não sejam no fundo armas?
Mas
o maior perigo desta gente vem de suas bocas. Em outros países
resolveram unir-se com jovens visionários e todos sabemos no que
deu. Por isto é melhor que o governo mantenha a sociedade livre
desta ameaça, pagando-lhes vencimentos miseráveis e evitando que
nossa mocidade receba suas más influências. Para tanto, o
patrocínio de programas televisivos e o uso da força policial se
tornam medidas necessárias.
Professores são extremamente perigosos porque podem
perturbar a paz social. Por vezes insistem para que nossos filhos
leiam livros, escrevam, pensem por conta própria. Que absurdo! Não
há necessidade de ler. Não há necessidade de pensar. Só
necessitamos de gente que trabalhe em silêncio para o crescimento do
país. E assim poderemos servir de modelo à toda terra.
Elenilton Neukamp
Este texto foi publicado originalmente em 2005, no jornal Zero Hora (do Rio Grande do Sul), e se refere à repressão policial sobre os professores/as na época.
Retorna 10 anos depois, após a violência brutal sofrida por professores/as no Paraná.
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