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25 novembro 2013

Um peixe metálico

Há fábricas de dias que virão.
Neruda

Em Isla Negra estão os restos do grande poeta. De frente para o Pacífico encontrou ele sua melhor morada. Ali mesmo, onde vivo abraçou-se com o mar revolto e conversou com as gaivotas.
O quarto de Pablo e Matilde era uma extensão do mar. Não se sabe bem se os estrondos ouvidos naqueles tempos eram os ecos daquele grande amor ou os rugidos do monstro marinho. 
A única demarcação de espaços entre a poesia e o mar é dada pelos sinos. Eles continuam lá, mas já não badalam. Sem o toque do poeta parece que morreram de tristeza. No entanto, correm boatos de que crianças que visitaram a casa viram um velhinho de boina tocando um sino quando o sol foi dormir.
Quando fui na casa de Neruda ouvi Gracias a la vida tocada ao piano. Sentado na areia grossa e multiforme - que foi tapete para seus passos - desejei o mate da mulher ao lado. E disse “gracias” ao meu próprio desejo. E por estar vivo joguei uma moeda e um pedido na fonte.

A casa do poeta é um lugar de peregrinação do sonho. Tudo nela é mar. Pedras, plantas, miniaturas de barcos engolidas por garrafas, belas carrancas de navios fantasmas, instrumentos de marinheiros devorados pelas sereias. 
Naquela casa senti-me como um peixe metálico flutuando em um de seus poemas.

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