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16 abril 2010

CINEMA E ESCOLA

Num mundo construído pela e na imagem, seria um absurdo a escola se fechar para as possibilidades da arte cinematográfica. Cinema e educação devem ser irmãos inseparáveis. O espaço do cinema e da “sala de vídeo” ou de audiovisual das escolas é um local privilegiado para o aprendizado, para a socialização de saberes. Assistir um filme com os alunos é tão importante quanto ler um livro, um texto, ou fazer uma prova. Chega a ser mesmo impressionante que muitos professores utilizem os filmes como algo secundário e muitas vezes sem a mínima seriedade.
Certa vez fui chamado de “elitista” em uma reunião de escola, por defender que não fossem exibidos apenas filmes de uma certa apresentadora de TV para as crianças. Este tipo de filmes elas já veem em suas casas, não há porque a escola reforçar a sua importância. Me acusaram de rejeitar os “saberes populares”. Retruquei dizendo que estavam subestimando a inteligência das crianças e limitando o acesso delas à cultura. A escola deve favorecer o acesso a outras linguagens, outras formas de expressão que não aquelas consagradas pela grande mídia.
Em meu trabalho de professor, sempre utilizei filmes. Jamais como forma apenas de distração dos alunos ou como algo complementar à sala de aula. Sonho com o dia em que lutaremos pelo acesso ao cinema com a mesma força que lutamos por outras boas causas. Lutar pelo acesso ao cinema é lutar pela elevação geral da nossa cultura. Esta batalha poderia estar ligada à produção nacional de cinema. Os países desenvolvidos há muito já se deram conta disso, e os americanos são mestres em utilizar a tela grande como meio de propaganda.
Para citar um pequeno exemplo, há muitos anos exibo para os alunos (adolescentes) o curta-metragem O dia em que Dorival encarou a guarda, de 1986. Ele é uma produção da Casa de Cinema de Porto Alegre, que é especializada na produção de curtas de boa qualidade. Conta a história de um preso que quer simplesmente tomar um banho, pois já é proibido de fazê-lo há 10 dias. Os diálogos são impressionantes e a montagem do filme é perfeita. Os alunos adoram! Em menos de 15 minutos há diversão, riso, aprendizado. Em Filosofia discuto a questão da liberdade.
Para cada filme o professor escolhe um tema específico ou vários temas para serem explorados. Barbosa pode discutir memória, história do Brasil, a existência ou não do destino. Ilha das Flores é um clássico, creio que o curta-metragem mais assistido em todo o Brasil.
O momento de assistir um filme também é um momento de aprendizado. Muitas vezes tive que parar a exibição, reclamar ou xingar algum aluno. Em alguns casos (poucos, é verdade) cheguei ao extremo de retirar da sala pessoas que não conseguiam assistir minimamente tranquilas. Também se aprende a ser expectador.
Com a ampliação do acesso à Internet nas escolas em todo país, o acesso aos filmes tornou-se mais fácil. Durante anos, corri para todos os lados atrás de fitas VHS e depois DVDs. Antes, na adolescência, mal tínhamos acesso a aparelhos de vídeo cassete. Então carregávamos um vídeo cassete (pesado) pela cidade para passar “vídeos” nas escolas sobre a destruição do meio ambiente.
Agora há projetos específicos como o “Curta na Escola”, que disponibiliza centenas de filmes gratuitamente na rede. Começamos a deixar de ser reféns dos filmes comerciais, o que não quer dizer que alguns deles não possam ter alguma utilidade.
Uma discussão importante a ser feita: a democratização do acesso à produção brasileira. Não parece estranho que os brasileiros não tomem conhecimento dos filmes que são feitos em seu próprio país? O mesmo vale para a música e o teatro. E a escola não pode se furtar a esta discussão. Na escola acontece a formação do público, seja que tipo de público for.
Compreender a educação como limitada à escola é limitar tanto a escola quanto a educação das pessoas. Para usar uma imagem, podemos dizer que a formação acontece em rede, numa teia. Tudo o que cai ou que é agarrado na teia torna-se parte dela. Uma música, um bicho ou um conceito em forma de pedra. “Caiu na rede é peixe”, diz o ditado popular. Assim acontece com a gente. A experiência mais ridícula, o inseto menos interessante...tudo faz parte da nossa formação. Às vezes uma palavra rude ou um breve olhar nos sensibilizam mais do que um grande acontecimento. Na rede intrincada da nossa memória as coisas não estão separadas, fechadas. Por isso a técnica e o pensamento técnico não podem dar conta de toda vida. São formas de pensamento úteis, mas muito pobres para dar conta da existência toda. Isto que os grandes poetas já compreenderam há milênios.

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