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08 agosto 2011

Giordano Bruno e a magia do infinito




Giordano Bruno (1548-1600) foi um grande filósofo italiano que viveu aquele período efervescente das grandes viagens marítimas e descobertas. Quando ele nasceu, para se ter uma ideia, os portugueses recém começavam a se instalar no litoral brasileiro. Haviam chego aqui menos de cinquenta anos antes.
Bruno cresceu em meio ao clima do Renascimento, da descoberta dos chamados novos mundos, da ascensão da burguesia. A arte como um todo passava a revalorizar o humano. As “ciências ocultas” e o esoterismo ganhavam adeptos e eram amplamente difundidas, embora proibidas. Os valores morais do cristianismo perdiam sua força e os detentores do poder, questionados, reagiam muitas vezes com uma violência bárbara. A revalorização da Antiguidade colocava em dúvida a filosofia dominante, baseada numa certa leitura de Aristóteles.
Mas é a teoria heliocêntrica de Copérnico (1473-1543) que vai exercer grande influência no pensamento de Bruno, pois vinha confirmar o que ele já conhecia através da leitura de textos antigos: a Terra não é o centro do Universo, como queria a Igreja, e sim um planeta como qualquer outro girando em torno do sol.
Ele não concordava com a visão predominante em sua época, de que o universo seria formado por coisas fixas criadas por um Deus transcendente. E ia além, afirmando que Deus na verdade não é um “primeiro motor imóvel”, como queria Aristóteles. Nada no universo é imóvel e Deus faz parte de tudo, ou melhor, Deus é o Todo e nós humanos seríamos seres privilegiados porque nossa mente é idêntica à divina.

O universo pensado por Giordano Bruno é infinito, em constante transformação, repleto de outros mundos habitados como o nosso, como já havia escrito Lucrécio 50 anos antes de Cristo: “Tudo o que existe é ilimitado...”, dizia ele.
Desde o século VIII e especialmente a partir do século XII, circulavam pela Europa as obras de Aristóteles, trazidas pelos muçulmanos. Estas obras vão mexer com o mundo cristão. A razão começa a ser recuperada, assim como o interesse pelo raciocínio e a observação.
Mas a redescoberta de Aristóteles acaba tornando-se um dogma, e nos trezentos anos posteriores apenas se veriam repetições do que ele disse, e tudo o que escreveu tomou a validade de lei inquestionável. O mundo aristotélico, estático e rígido, era ideal para manter a segurança e a fé numa verdade inabalável (como queria a Igreja), uma verdade que servia para a manutenção de quem estava no poder.
Nesse meio tempo muitas vozes irão questionar tudo isso. Entre elas estão Roger Bacon e Guilherme de Ockham.
Giordano Bruno talvez seja a figura mais característica daquele período, pois era um verdadeiro eclético, que bebeu de todas as fontes do seu tempo. Ela tentava mostrar, com suas pesquisas em diversas áreas do conhecimento, que sobre uma mesma realidade pode-se ter pontos de vista diferentes e até mesmo conflitantes. Nos dias de hoje isto pode parecer até óbvio, mas naqueles dias podia custar a vida, como de fato aconteceu: Giordano Bruno foi queimado vivo pela Inquisição, em 17 de fevereiro de 1600.
Para Bruno o mundo era coberto de signos que necessitavam apenas ser decifrados. As verdades que estes signos, estas marcas contém, eram tão universais quanto o próprio Deus. Elas estão inscritas no universo. Um universo vivo, cheio de correspondências, animado e povoado de espíritos, que fala o tempo todo e sua fala pode vir tanto das estrelas como dos vermes da terra.
Ele olhava para o alto e via um espaço repleto de outros seres como nós, um universo homogêneo e inteligente, composto de mundos em correlação infinita, unidade de ser e de vida, extensão do ser divino uno e total.
No homem se reflete a inteligência do universo, e em sua mente encontra-se contraída e inteira a ordem do mundo. A dignidade do homem está em ser ele igual à unidade a qual pertence, e seu poder de conhecimento e participação provém da totalidade e existe para ela. A importância da magia na obra de Bruno se encontra neste ponto, pois é através dela que o homem alcançaria o seu máximo poder de conhecimento e desvendaria os segredos da Natureza, segredos esses que são o próprio conhecimento.
Bruno afirmava que a reforma moral se produz no céu. Quer dizer, da mesma forma que os astros receberam novas posições no céu, dentro do homem também deveriam ocorrer as mesmas transformações. É na mente que se processam todas as mudanças, por isso o homem é o lugar cósmico por excelência, centro de todos os centros, lugar onde convergem céus e terra.
Bruno pretendia realizar na mente das pessoas a mesma revolução que estava acontecendo na maneira de pensar o universo. Retirar a Terra do centro de tudo não poderia ser algo tão simples e deveria acarretar enormas transformações de pensamento.
Uma destas transformações refere-se a ideia de Deus. Deus está em todas as coisas, ele é a alma do universo. Decifrar a natureza é desencadear seu poder. Porque Deus, enquanto objeto de estudo da filosofia, é a própria natureza. Assim, como natureza, ele é a causa e o princípio do mundo. “Causa” no sentido de determinar as coisas que constituem o mundo, permanecendo distinto delas; “princípio” no sentido de constituir o próprio ser das coisas naturais. Deus, segundo Giordano Bruno, é “todo o infinito implícita e totalmente”.
Difícil de entender? Talvez. Mas o mais provocador, para a época, é o que ele deduz de tudo isso. O homem, para chegar a Deus, ao invés das orações e palavras convencionais teria que passar pela natureza e suas manifestações. A natureza seria a voz viva, a palavra original que fala a própria linguagem divina. Cabe aos homens então decifrá-la, acordando do sono do cristianismo.
Bruno leu os textos antigos, sobretudo os famosos escritos de Hermes Trismegisto e lançou sobre eles o olhar de seu tempo: a religião mágica egípcia seria a única religião verdadeira e teria sido corrompida e obscurecida pelo judaísmo e pelo cristianismo. Dentro dessa tradição Deus aparece como “sem forma e sem figura”, privado de essência.

Elenilton Neukamp

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