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03 maio 2013

A memória e o meu sapato sujo


 Vou indo até a Restinga, como faço quase todos os dias, e vendo a antiga Zona Sul desaparecer. Onde era verde agora é condomínio. Onde era árvore agora é clarão, concreto, prédio feio. Não sei por que Porto Alegre anda com esta mania de coisa feia, e ainda nem comecei a falar de mim.
Lembro de estar em algum boteco comento um prato feito. Era um sábado pela manhã. Bendita memória! O repórter do jornal da RBS na fila de votação para as “assembleias populares” do Plano Diretor. Perguntou para as pessoas: “O que vocês vieram fazer aqui?”. Ninguém sabia dizer. Eram pessoas simples. Estavam ali porque haviam ganho uma cesta básica e não lembro que quantia em dinheiro. Tudo pago pelas indústrias da construção, vulgarmente conhecidas como empreiteiras.
Esta foi a forma altamente democrática como a principal lei que organiza a ocupação da cidade foi mudada. Bairros residenciais viraram inhaca. Tudo, claro, escolhido pelo povo. E quem era o secretário municipal responsável por essa beleza de processo democrático? Bingo! O nome dele era... José Fortunati.
Mas por que cargas d'água estou falando tudo isto? Não sei, mas aquele prato feito estava mesmo uma delícia. E barato. Provavelmente melhor do que a comida que se serve lá no Presídio Central.
Ando pensando nisso. E naqueles pobres homens de bem que foram presos, acusados de negociar licenças ambientais. Tudo conspiração da Polícia Federal tentando denegrir a imagem dessa gente de conduta ilibada. Nossa! Falei bonito mesmo. Me senti até um advogado nessa hora.
O deputado José Otávio Germano disse que só ele e Deus sabem o que ele passou nos últimos anos. Que lindo isto, me emocionei. Tudo acusações falsas. Só Deus deve mesmo saber por que ele foi denunciado como o chefe da quadrilha que roubou 44 milhões do nosso dinheiro.
É claro que uma coisa não tem nada a ver com a outra. Dinheiro que some no Detran e secretários de meio ambiente que vão nanar no Centralão. E é mera coincidência que o prefeito hoje seja aquele mesmo secretário do dia em que eu estava no boteco, comendo aquele prato feito.
Veja como a memória da gente é maluca. Lembrei que Fortunati já anda por estas bandas há uns bons trinta anos. Tô ficando velho, mano. Ele já foi sindicalista, deputado daqui e de lá, vice-prefeito do PT, vereador do PT (de novo), secretário de educação do estado governado pelo PMDB, secretário municipal de um monte de negócios, vice-prefeito do PDT, prefeito. Ufa! Quanto cargo! E quantos amigos ele não deve ter. A amizade é tudo na vida.
Em todos estes cargos que ocupou ele deixou sua marca. Qual é a marca, você me pergunta? Ah...bom...deixa eu pensar. Perdão, só um pouquinho. Preciso parar um pouco de escrever. Pisei num cocô.
Já estou de volta. Sobre o que falávamos mesmo? Licenças ambientais, José Otávio, cadeia, prefeitura de Porto Alegre, prato feito. Desculpe, mas fiquei meio tonto aqui. A cidade é tão grande e o presídio tão apertado pra tanta gente. Deixa eu ver meu sapato. É que o cheiro está ruim mesmo, sabe como é. Não adianta ficar escrevendo bonito se o sujeito fica andando por aí com o sapato cheio de cocô. E você sabe que a cidade está cheia de sujeira por todo lado. Precisando de uma limpeza geral. O lixo pesado não dá nem pra reciclar.
Tá, prometo que não mudo mais de assunto. Confesso que não sei qual é a marca do Fortunati. Já sei: vou perguntar pro Kiko!
Talvez a sua marca seja aquele sorrisinho, que de tão repetido já grudou e não sai mais. Nem plástica mais resolve. Tadinho.
Outro dia ele disse que “o secretário Záchia é a cara da nossa administração”. Pois não é que a cara da nossa administração andou na cadeia? Como é que a gente faz quando a cara da gente vai presa? Pensei em conversar sobre isso com meu amigo Lasier, que sempre sabe de tudo. Convidei-o para tomarmos um café na Cidade Baixa mas não teve jeito. O lugar está tomado por anarquistas mascarados, estes perigosos.

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