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24 maio 2012

Beijos e bicicletas

É um proteijo ou um beijotesto? Uma mistura de beijos com reivindicação. Um protesto poético, como há muito os protestos esqueceram de ser... Hoje, em frente à prefeitura de Porto Alegre, os casais se beijaram para pedir mais ciclovias. E recriaram aquela foto famosa do fotógrafo francês. Pelo jeito que as coisas andam e pela mediocridade destes que governam a cidade, teremos que fazer ainda muitos e muitos outros destes atos inspirados. Beijemos então. E que os nossos beijos parem as cidades e escandalizem aqueles que pensam as ruas apenas para os carros.
(Foto: Fernando Gomes/Agência RBS)

22 maio 2012

Xuxa e a violência contra as crianças

Não tenho nenhuma simpatia pela Xuxa e o que ela representou para uma geração inteira de crianças do Brasil. Nem me interessam os programas de domingo da TV (que jamais assisto), nem os motivos pelos quais ela resolveu falar publicamente que foi abusada sexualmente várias vezes. Mas o que ela fez me parece digno. Uma pessoa com esta projeção tocar num tema tão importante, sempre é bom! Uma coisa sou eu, por exemplo, conversar sobre isso com meus alunos/as na sala de aula. Outra é o assunto tomar esta proporção, a partir de alguém famoso. Muitas meninas devem ter se sentido representadas no que ela disse, e isso é MUITO importante. E o que ela disse é exatamente o que as gurias dizem: se sentem humilhadas e ao mesmo tempo culpadas pelo que sofrem, porque não percebem na sociedade qualquer preocupação com elas. Junte-se a isso, hoje, a moda do funk carioca e suas letras carregadas de preconceito e menosprezo às mulheres...e está pronto o caldo de cultura que alimenta a desgraça. A violência sexual contra as meninas é muito, muito maior do que se imagina. É uma tragédia nacional e só quem tem contato de alguma forma com esta realidade, como nós professores, sabe o drama e a impotência que sentimos muitas vezes. É claro que ela não se limita à periferia, mas é lá que aparece mais escancarada. Espero que a fala da Xuxa abra caminho para campanhas, projetos, ações concretas contra este drama. Milhares de meninas que sofrem em silêncio esperam por isso, neste país onde parece mais importante falar em Copa do Mundo do que nas pessoas que nele vivem.

14 maio 2012

Pablo Neruda

"Há fábricas de dias que virão" (Neruda). Em Isla Negra estão os restos do grande poeta. De frente para o Pacífico encontrou ele sua melhor morada. Ali mesmo, onde vivo abraçou-se com o mar revolto e conversou com as gaivotas. O quarto de Pablo e Matilde era uma extensão do mar. Não se sabe bem se os estrondos ouvidos naqueles tempos eram os ecos daquele grande amor ou os rugidos do monstro marinho. A única demarcação de espaços entre a poesia e o mar é dada pelos sinos. Eles continuam lá, mas já não badalam. Sem o toque do poeta parece que morreram de tristeza. No entanto, correm boatos de que crianças que visitaram a casa viram um velhinho de boina tocando um sino quando o sol foi dormir. Quando fui na casa de Neruda ouvi Gracias a la vida tocada ao piano. Sentado na areia grossa e multiforme - que foi tapete para seus passos - desejei o mate da mulher ao lado. E disse “gracias” ao meu próprio desejo. E por estar vivo joguei uma moeda e um pedido na fonte.
A casa do poeta é um lugar de peregrinação do sonho. Tudo nela é mar. Pedras, plantas, miniaturas de barcos engolidas por garrafas, belas carrancas de navios fantasmas, instrumentos de marinheiros devorados pelas sereias. Naquela casa senti-me como um peixe metálico flutuando em um de seus poemas.

12 maio 2012

Escorpião

Eu sou o escorpião. O limite tênue entre a morte e a vida, a fera e o anjo. O escorpião não vacila: cercado pelo fogo e na iminência de uma morte agonizante e lenta, pica-se e morre. O veneno dos outros escorpiões nada pode contra ele. Mas o seu próprio veneno lhe é mortal. A pergunta pelo suicídio é constante, está inscrita em seu corpo, por isso o escorpião precisa escolher a vida a cada dia. Age como se seu tempo estivesse acabando. É apaixonado, constante em seus altos e baixos, exige compromisso e entrega total. Para o escorpião não há tempo senão o tempo de viver. Ele não quer distração, quer estar atento, quer atenção.