Total de visualizações de página

10 julho 2011

Memória das casas

Minha avó tinha um sorriso que dizia sempre alguma coisa. E nunca houve coisa triste em seus sorrisos. Quando voltei à casa onde habitava a sua doçura fiquei procurando por seu sorriso. Em vão, graciosamente em vão. Estava lá a casa e suas memórias. Minha avó eu fui encontrar dentro de mim.

Fiquei pensando cá com a amada. Sobre o que habita nas casas da nossa memória. Meus alunos falam em fantasmas. Outros farejam cheiros no pano de prato molhado. Nossa memória gira como um caleidoscópio, jogando-nos como marionetes num sonho que nunca terá fim.

Para alguns seria impossível voltar até as casas da infância. Ou as casas reais não existem mais, ou as imaginárias foram sendo derrubadas uma a uma. Será que a arquitetura estuda isto? A memória que as pessoas têm dos lugares onde viveram.

Será que existem deuses para os mortos das casas velhas? Há religiões que os cultuam?

Nos Maias de Eça de Queirós boa parte da história se passa no enorme casarão, o Ramalhete, que depois de há muito fechado dois dos personagens irão revisitar e sentir. Abrir a janela de uma casa abandonada é como jogar luz no rosto dos fantasmas dela. Assim como na literatura, casas e lugares nos assombram.

Elenilton Neukamp

[Fragmento do livro "A caixa de perguntas", que devo publicar este ano]